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investigandoonovoimperialismo

Tailândia: O temor de perder o poder

21.12.08

Setembro de 2006. O então primeiro-ministro, Thaksin Shinawatra foi deposto por um golpe militar que contou com o beneplácito do palácio real. Depois de meses sob a direcção dos golpistas, as novas eleições reproduziram uma situação semelhante. Os candidatos apoiados por Thaksin a partir do exílio conseguem a maioria. Ao longo de 2008, sucederam-se as manobras e conspirações golpistas de uma aliança política, que historicamente manobrou os rendimentos do poder e que é formada por monárquicos, pela extrema-direita política e por uma boa parte da engrenagem militar e judicial, sem esquecer as classes económicas melhor situadas que, por sua vez, dominam os meios de comunicação tailandeses.

 

A sucessão de acontecimentos deixa antever uma clara divisão política, económica e regional. Poucos duvidam de que as classes mais favorecidas do país se sentem incomodadas pela onda populista que tomou a Tailândia. Para os quadros militares, empresários e para a monarquia, a vontade popular não pode ser respeitada se esta põe em perigo os seus privilégios.

 

“Os votos e a democracia servem, se acompanham os meus interesses”, poderia ser o lema de muitos dos fervorosos defensores do sistema democrático ao estilo ocidental. A vontade popular é respeitável, se coincide com os interesses das classes dominantes, se não, pode-se sempre acusar os novos governantes de populismo ou colocar em marcha os mecanismos destinados a produzir um golpe de estado ou a gerar uma situação ingovernável que provoque a convocação de eleições.

 

No caso da Tailândia, as forças reaccionárias jogam esta cartada há já alguns anos, e cada ilegalização ou golpe militar, longe de gerar os resultados esperados pelos golpistas, significaram o reforço das posturas que impulsionam uma certa mudança política e social. O que parece mais evidente, por trás da máscara turística e monárquica que envolve a Tailândia, é que nos encontramos perante “uma frágil democracia”. Um sistema onde os militares não se coibiram de intervir, onde a monarquia sai sempre vitoriosa e onde a exclusão dos mais desfavorecidos permite a manutenção do status quo bem longe de qualquer parâmetro medianamente democrático.

 

A luta entre os partidos demonstrou ser uma luta pela aproximação aos círculos do poder. A elite política tem estado acostumada a jogar com essas regras de jogo, e qualquer mudança ou interferência, sobretudo se pressupõe uma perda de controlo, gerou múltiplas manobras golpistas e conspirativas das últimas décadas.

 

A divisão política está a par de uma crescente divisão territorial. As tensões regionais não são novas, apesar dos diferentes governos terem pretendido ocultá-las utilizando a figura “unificadora” do monarca e, por vezes, a mão das Forças Armadas, aliadas históricas do palácio real. Durante anos, procurou-se criar um modelo unitário em torno do sentimento “tailandês”, com Banguecoque como modelo, mas sem incorporar as diferenças e as exigências da periferia.

 

Tailândia, Retirado do Gara

 

Os reinos centrais da Tailândia foram colocados nos textos de ensino, enquanto que outras realidades se ocultaram intencionalmente, gerando desconfianças e rejeições. Dentro das actuais fronteiras, o papel de alguns reinos – Lanna, no norte, o sultanato de Patán, no sul, ou a influência do reino de Lao – foi menosprezado ou ignorado. A partir de Banguecoque procurou-se “desgastar sistematicamente os vestígios desses reinos independentes”.

 

O futuro da Tailândia está preso por um fim e são muitos os que se questionam sobre o que acontecerá depois da saída dos turistas ocidentais. A luta pelo poder entres as elites locais, a credibilidade democrática de umas instituições (militares, políticas e judiciais) presas à defesa de determinados interesses e o fosso entre o centro e a periferia são suficientemente importantes para colocar o futuro em dúvida. As forças reaccionárias solicitam a convocação de novas eleições, com a esperança posta na ilegalização do partido governante. No entanto, este já se posicionou, e tem na calha um novo partido político, Puea Thai, que segundo as sondagens voltaria a ganhar as eleições com o apoio das classes rurais e urbanas mais desfavorecidas, que constituem a maioria do país.

 

Perante isto, as forças mais reaccionárias – monárquicas, empresariais e militares – apostam num sistema “democrático” onde a maioria da população fique excluída, já que para esses actores, “as massas são demasiado ignorantes para decidir o rumo do país”.

 

O colapso que a Tailândia pode enfrentar com a fuga do turismo e a paralisação dos sectores económicos, unidos à crise financeira mundial, começou a abrir brechas nas fileiras opositoras, mais dispostas a defender os seus interesses do que a lutar por transformações sociais. Os rumores de golpes militares e judiciais aumentaram, mas provavelmente nem uns nem outros servirão para mudar a decisão da maioria da população, cansada de suportar a sucessão de governos das classes dirigentes. As divisões dentro dos militares e da oposição – entre os que estão dispostos a provocar o caos generalizado e aqueles que resistem a perder benefícios como o turismo – tornam mais difícil adivinhar o futuro.

 

Os movimentos dos últimos dias estão dirigidos a provocar uma intervenção militar ou do palácio real, mas as divisões são cada vez mais evidentes e as classes mais pobres do norte e nordeste, e os muçulmanos do sul, dificilmente aceitarão uma repetição do roteiro golpista.

 

Os olhares centram-se nos militares. Como bem assinala um académico local, “o papel dos militares é evidente, se não como entender a tomada dos aeroportos, instalações de alta segurança controladas por eles”. Ninguém esconde o silêncio cúmplice do palácio real e, em certa medida, o das diplomacias ocidentais que não se manifestaram tão firmes com o fizeram noutras ocasiões.

 

 

Texto de Txente Rekondo (Gabinete Vasco de Análisis Internacional) publicado no jornal Gara a 3 de Dezembro de 2008. Tradução de Alexandre Leite para a InfoAlternativa e Tlaxcala.

 


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